O capitalismo é realmente brutal – conseguem prender em um domingo qualquer a comemoração de um dia que deveria ser celebrado e respeitado o ano todo. Não sei a origem da comemoração do dia das mães, mas me incomoda saber que o maior mistério da humanidade, a capacidade de transmutar o etéreo em carne, foi reduzido a uma data comercial no segundo domingo de Maio, onde as pessoas trocam presentes e se empanturram de comida. Fique claro que sou completamente contrária a essas propagandas que estigmatizam a mulher como um ser incompleto e tentam vender a imagem de que ela só é completa quando tem filhos – A maternidade compulsória é um desrespeito enorme, quase tão grande quanto reduzir a celebração das mães a uma data comercial. O gerar e o nascer são mistérios, são energias poderosas, e devem ser encarados com respeito – nem todas desejam passar por tal experiência e isso é um direito. De repente, me dou conta de que o texto que deveria ser poético está se tornando uma pequena dissertação! Mais cedo estive na casa de um grande amigo que está fazendo aniversário hoje e, na volta, dentro do ônibus me peguei observando algumas mamães e seus filhos – é uma sensação estranha, pois até alguns anos atrás a simples idéia de ficar vulnerável e ter algum outro ser totalmente dependente de mim me causava arrepios e repulsa. Não sei quando isso mudou – o fato é que algumas vezes me pego pensando se ainda terei tempo de ter um filho ou filha e isso causa angústia- Trinta e três anos, nenhuma perspectiva de casamento ou romance. Já considerei mesmo a idéia assustadoramente cara e nem um pouco prática de uma inseminação, como um último recurso da minha completa falta de habilidade com os relacionamentos – Intensidade demais talvez não seja exatamente algo atraente, acreditar que o amor é único e ser quase incapaz de traçar novos envolvimentos possivelmente sejam fatores fora do padrão pra sociedade superficial e vazia da atualidade – mas esses são assuntos para outros textos, mais comuns e freqüentes por aqui inclusive. Já antecipo que alguns leitores certamente irão comentar que existe adoção, uma atitude louvável e bela em minha opinião, mas completamente fora dos meus planos – meu lado mulher-bruxa tem essa necessidade de explorar a sensação de ser um portal a trazer mais uma alma para esse mundo maluco que, possivelmente nem mereça toda a inocência e doçura de um novo ser.
Percebo que este texto é possivelmente um dos mais íntimos que escrevi – sem subterfúgios, sem poesia, sem contos, sem cartas ou devaneios. A vida vai além de sentir saudades de um amor que nunca vai ser aquele final feliz, vai além de observar detalhes pequeninos nas ruas ou elaborar resenhas de livros e filmes e eu posso estar romantizando absurdamente tudo isso, mas não são raras as vezes em que penso o quanto seria doce ensinar as primeiras receitas ou notas musicais pra uma criaturinha, ou dar o primeiro caderno em branco para que uma menininha ou menininho tímido escreva seus primeiros pensamentos (Diários da mini poetisa?). São cenas que tem uma grande possibilidade de jamais acontecerem no mundo real, mas que eu precisava deixar escritas por aqui – Pra relembrar no futuro, quando eu for a senhorinha que ainda se divide entre a cozinha, a poesia e os cachorros – sozinha em seus sonhos não realizados e corações partidos.
_______________________________
Enquanto escrevo, além do som contínuo da chuva, ouço: