Um conto de descobertas na escuridão, parte II: Coroada

Depois de algumas voltas com os olhos vendados e as mãos dele passeando pela sua pele, ele estacionou novamente o carro. A luz do sol inundou seus olhos quando ele removeu a venda de seus olhos. Sentiu o vento balançar seus cabelos quando abriu a porta e ficou em pé. Então ele pediu que ela fechasse os olhos novamente – ouviu o porta malas abrir e sentiu algo ser colocado em suas mãos – uma coroa com pedrinhas coloridas. Ela sorriu, ele delicadamente a virou e, retirando-lhe a coroa das mãos. Já não era o vento que mexia em seus cabelos, e sim as mão de seu príncipe que, com toda delicadeza lhe coroava. Caminharam pela rua pouco se importando com alguns olhares curiosos. Era seu dia, seu aniversário, e aquela tarde tão perfeita a fazia sentir-se uma princesa de verdade, uma princesa debutante do mais belo reino: O reino do coração daquele Príncipe que a escoltava com atenção e carinho pelas ruas naquele final de tarde quente. Ele a levou até uma sorveteria discreta e acolhedora – o geladinho do sorvete deslizando pelos seus lábios contrastava com o calor do desejo que inundava seu corpo. Ela simplesmente desejava que ele pudesse fazer amor com ela ali, deitada sobre aquela mesa entre sorvetes e coberturas – e pensar isso a assustava: Tais pensamentos jamais a haviam invadido antes! Sempre acreditara que um relacionamento feliz deveria ser casto e, de repente, sua imaginação devaneava libidinosamente. Seria ele um Príncipe ou um feiticeiro? Ou um príncipe feiticeiro que a arrasta em meio a tempestades e mistérios sensuais que até então desconhecia?

            O caminho de volta é tão intenso quanto o início do passeio – A venda nos olhos amplia seus sentidos, como se a retirada temporária da visão pudesse fazer com que tudo se tornasse mais intenso. Ela se esforça para calar seus próprios pensamentos – Deseja desesperadamente acreditar que aquela tarde foi um encontro entre um garoto e uma garota que estão descobrindo sentimentos intensos juntos, mas, no fundo, ela sabe que foi um encontro entre os personagens que criaram para viver em uma realidade paralela – um jogo onde há prazer sem que a paixão os fira. Ela sabe que, no dia seguinte, quando estiver comemorando sua primavera, ele estará presente em seu almoço entre amigos – e sabe que ele a olhará com o carinho da amizade, mas sem o ardor quase palpável com que a olhou hoje. Todos esses pensamentos não seguem uma linha de raciocínio, ela apenas tem lampejos entre um toque e outro, entre um sussurro e outro. Ele a está levando para casa – Uma princesa na carruagem de seu príncipe. E ela sabe que, assim que colocar os pés do portão para dentro, irá dedicar-se ao preparo dos pratos a serem servidos no dia seguinte, e que, ao cair da noite, após um banho, ela irá pegar seu caderno e escrever todos estes pensamentos – e nesse momento, observando a coroa repousar na estante, ela se sentirá novamente uma princesa, uma princesa solitária aguardando seu romântico final feliz que, provavelmente, não esteja escrito no livro da vida. E ainda assim ela irá sorrir, pois ao menos aquela personagem obscura, que é também parte dela, conseguiu encontrar seu lugar.

(25/11/2017)

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PASSAPORTE DA LEITURA: MÉXICO

Mês passado eu falei um pouco sobre o Passaporte da Leitura e a ideia de iniciar um canal especialmente para falar sobre os livros que fosse lendo. Pois bem, o canal ainda não saiu do papel, mas as leituras já estão a todo vapor! Para quem não lembra, a proposta que me fiz depois de ganhar o Passaporte da Leitura foi a de ler um livro de cada país do mundo – ideia ousada, mas divertida! A primeira parada será no México, acompanhando o romance impossível de Pedro e Tita da obra Como água para chocolate, de Laura Esquivel. O livro foi indicado pelo querido amigo Carlos, o mesmo amigo que me presenteou com o Passaporte da Leitura. Tenho que dizer que foi uma indicação literária que me emocionou bastante, pois eu e a Tita temos algo muito íntimo em comum: O amor pela arte culinária.

Como água para Chocolate

Autora: Laura Esquivel

País: México

O amor entre Pedro e Tita poderia ser comparado ao amor impossível de Romeu e Julieta – Um amor que preenche a alma dos jovens enamorados com um brilho único e uma dor voraz, impedido não pelo ódio, mas por uma antiga tradição familiar.

Tita vem ao mundo antes do tempo – Nasce na cozinha, sobre a mesa onde sua mãe chorava cortando cebolas “bem fininhas”. E será a cozinha seu refúgio durante a vida. A ela cabe um destino solitário: Como filha caçula, deve cuidar de sua mãe até que ela morra – Com isso, está destinada a ver ser-lhe negado o direito ao amor e ao casamento. O que sua mãe não imaginaria é que Pedro, que ama Tita com fervor e devoção, seja capaz de sacrifícios extremos para ficar ao menos um pouco próximo de sua amada.

A obra de Laura Esquivel apresenta o amor verdadeiro e puro através de nuances poéticas, em uma escrita rica e repleta de emoção. Tita é uma personagem doce, encantadora e que amadurece de forma dura. Outro detalhe que torna o livro inesquecível: A história é contada sempre a partir de receitas mexicanas típicas da época retratada – Dá vontade de preparar cada uma das receitas e provar o sabor, os sorrisos e as lágrimas de Pedro e Tita.

Sobre a Autora:

Laura Esquivel nasceu na Cidade do México em 1950. Começou a escrever quando trabalhava como educadora, para suprir a falta de materiais didáticos para as crianças. Posteriormente estudou também cinema e elaborou roteiros. Influenciada pela Avó, matriarca tradicional que costumava reunir as mulheres da família na cozinha, Laura passou a acreditar que este seria o ambiente perfeito para a troca de ideias e confidências entre mulheres. Atualmente, Laura é Deputada em seu país.

Sobre o México:

O México ou Estados Unidos do México é um país localizado na América do Norte cujo território abrange uma área de 1 958 201 km2, abrigando cerca de 109,6 milhões de pessoas. A capital do país é a cidade do México. O país é uma república presidencialista que foi colônia espanhola, tendo declarado sua independência em 1810 e reconhecido como nação independente em 1821. Em relação ao idioma nacional há o Espanhol, além de 67 idiomas indígenas. 

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Um conto de descobertas na escuridão (Parte I)

            Olhou-se no espelho – usava um vestido preto com decote em V, de comprimento pouco acima dos joelhos. Ajeitou os cabelos – queria volume, ousadia e maciez. Em alguns minutos ele chegaria e ela deixaria de ser ela para tornar-se a personagem que descobrira em si mesma no último encontro – ela seria a Baby – uma jovem ávida por novas experiências que envolvessem seu corpo sem partir seu coração.  Ela sentiu os olhos dele passearem lentamente por ela enquanto ele abria a porta do carro – Ele dirigiu pouco mais de um quarteirão e parou para colocar-lhe uma venda nos olhos. Naquele momento toda sua visão se escureceu – E ela começou a perceber outras sensações com mais intensidade: O balançar suave do carro, as curvas, a música, a própria respiração… E de repente sentiu as pontas dos dedos dele passearem pela pele de seu braço – foi rápido, apenas um toque leve – que a fez suspender a respiração por alguns segundos. Pouco depois sentiu os dedos passearem levemente por cima de suas mãos e pernas – eram toques suaves, mas que a faziam vibrar. Acariciou seu pescoço e o rosto, delineando a linha dos lábios – e ela respirava pesadamente. Seu ventre se contraía com um prazer desconhecido e ela desejava que ele a tocasse em partes onde jamais havia desejado ser tocada antes – aquela parte que era o delta do corpo feminino estava latejando – havia um calor emanando de seu corpo. Era torturante que ele a acariciasse tão levemente e não permitisse sequer que ela o tocasse. Era deliciosamente torturante sentir o toque das mãos dele antes mesmo que a pele encostasse-se à dela, como se estar privada da visão a fizesse ampliar os outros sentidos. Ele colocou as mãos dela apoiadas sobre as coxas, com as palmas para cima. Acarinhou-lhe as palmas das mãos e os pulsos. A voz dele estava rouca, diferente da voz do amigo com quem convivia – era uma voz recheada de provocação e desejo –Ela e a sua personagem ainda brigavam – A personagem, satisfeita. Ela desejando ouvir uma declaração de amor que no fundo sabia que não aconteceria. Fechou os olhos, embora a venda não lhe deixasse ver nada. Concentrou-se apenas nas sensações boas que ele lhe dava e deixou que a Baby tomasse conta de seu corpo e mente. Ele parou o carro e, delicadamente retirou a máscara de seu rosto – estavam em uma rua estranha, meio deserta, quase abandonada.  – Ele indicou uma porta de madeira, com uma escadaria grande e ela subiu – Era um lugar agradável, simples, bastante alternativo. Ela observava a rede pendurada a um canto e secretamente desejava que ele a deitasse ali e a beijasse como se o mundo fosse acabar – fora o passeio surpresa perfeito. Ela já deveria saber o quanto ele podia ser surpreendente quando ele desceu as escadas chamando-a para acompanhá-lo até o carro. Colocou-lhe a venda sobre os olhos e a acariciou novamente enquanto rodavam pela cidade. Ele a tocou com mais intensidade desta vez, percorrendo com os dedos todo o espaço livre por baixo de seu vestido, explorando seu delta de feminilidade. Era constrangedor sentir aquele toque, mas ao mesmo tempo, ela sentia que iria desfalecer se ele parasse. Ele a provocava e a fazia gemer baixinho, quase ronronando como um felino. Ela desejava que ele a beijasse, mas ele tinha outros planos e não permitia que ela sentisse seus lábios mais do que alguns segundos. Ela desejava sentir a língua dele brincando dentro de sua boca enquanto as mãos exploravam suas pernas e recantos mais ocultos e pecaminosos. Ele perguntava com aquela voz rouca e sexy como era gostava de ser tocada, mas ela não sabia responder, pois nunca conhecera um toque antes. E ele alternando a velocidade e intensidade a acariciava, até que ela explodiu em um gemido e sentiu suas pernas se inundarem de uma umidade quente e o corpo relaxar libertando toda a tensão acumulada durante as carícias – atingira o primeiro orgasmo de sua breve vida – Ela desejava beijá-lo, tocá-lo, mas ele a deitou sobre as pernas com o traseiro levemente levantado. Acariciou com delicadeza “– nós vamos aprender duas palavras hoje – Amarelo e Vermelho” – ele disse. “- Amarelo você deve dizer quando sentir que seus limites estão sendo ultrapassados de forma desconfortável. Se você disser “Amarelo”, deixarei mais brandas as palmadas. Ele explicou também que “vermelho” é a palavra que ela deveria dizer caso realmente desejasse parar. Durante todo o tempo, suas mãos a acariciavam e sua respiração lhe deixava arrepiada – de repente, ela sentiu sua mão acertar em cheio suas nádegas “- Conte.” Ele disse. Foram sete palmadas.

Ela estava novamente sentada e presa ao cinto de segurança. Sentiu quando ele ligou o carro e colocou-se em movimento. A escuridão dos olhos vendados não lhe escurecia a alma ou os desejos que irradiavam em seu corpo. Ela sentia novamente as mãos a tocar suas partes mais intimas – tinha medo que alguém no carro ao lado pudesse ver, tinha medo de serem parados pela polícia e terem que explicar o motivo da venda – E a sensação de medo pouco a pouco ia se misturando com a sensação de desejo que a invadia como uma onda quente e intensa – A música, as mãos dele, a respiração dos dois, tudo a sugava para uma dimensão paralela e única – e neste momento ela ouviu a voz dele pedindo que não se segurasse – e então, ela deixou-se engolir novamente por aquela onda de prazer que a deixara sem chão.

(25/11/2017)