Rua 2

“Caro Leitor, você acaba de receber em mãos um livro artesanal produzido pela Scenarium e aqui vão algumas instruções de uso…

Aprecie a capa… ela é como um velho portão, que dá entrada para uma realidade de páginas devidamente numeradas. Verifique o número do seu exemplar… E depois a sequência de páginas. A menos que o projeto seja insano, a sequência é como a das casas, de um lado você encontrará os números pares e, de outro, os ímpares…”

As palavras acima são as primeiras linhas escritas no livro “Rua 2” , contos de Obdulio Nuñes Ortega.

Em textos curtos, que em sua maioria recebem como título o número das casas onde moram as personagens, Obdulio nos apresenta personagens urbanas detentoras de personalidades únicas que leva o leitor a sentir uma interação com a personagem. A estrutura da obra, aliada a capacidade criativa e refinada observação humana do autor faz do livro Rua 2 uma obra genial.  Destaco aqui os textos: Morador da rua 2, casa 11, casa 9, casa 15, casa 2, linhas cruzadas e Pescoços quebrados da rua 2. Não me atrevo a dizer que são os melhores textos do livro por acreditar que é impossível estabelecer este tipo de juízo. Prefiro dizer que são os textos que mais gostei dentro de um livro dinâmico, envolvente, gostoso de ler e que deveria ser parte da lista de leituras de quem realmente aprecia a literatura brasileira.

Quer ler? Acesse a Scenarium Plural e adquira seu exemplar!

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Lunna Guedes, Adriana Aneli, Mariana Gouveia, Claudia Leonardi, Roseli Pedroso, Obdulio, Ale Helga

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Letícia, a nova vizinha – Ou o prato de sopa onde Berilo acredita que tudo deveria ter começado

(É possível entender este conto sem ler os outros dois, mas, caso você deseje – E eu espero que deseje – ler os dois primeiros contos e entender melhor a história, clique aqui e depois aqui)

Péssimo dia para uma mudança. Fazia frio e a garoa não dava trégua. Dois homens visivelmente mal-humorados vão tirando as caixas e móveis de dentro do caminhão-baú. Da janela, Berilo observa curioso o trabalho deles. Não parece nada fácil. Apesar do frio, se ocupa em tentar descobrir quantas pessoas irão morar no apartamento 701, o único vago do prédio. A pessoa teria alugado ou comprado? Seria uma família com crianças barulhentas ou um estudante universitário que chegaria tarde, fazendo arruaça e acordando os vizinhos de sono mais leve? Então, ele a viu: Uma moça de estatura baixa, pele bronzeada e cabelos encaracolados. Parecia bastante jovem, possivelmente iria morar com a família – Ao menos não haveria bagunça de criança pelos corredores nem ébrios desajeitados fazendo barulho pelas madrugadas. Ela era sem dúvida uma das criaturas mais bonitas que Berilo já havia visto na vida. Ele olhou para a sopa de espinafre que fervia no fogão. Podia parecer clichê ou cena daqueles filmes norte-americanos onde algum vizinho interessado em saber mais sobre novos moradores, leva uma torta de frutas e se oferece para ajudar em qualquer coisa. Talvez seguir roteiros clichês de vez em quando fosse uma boa ideia. Pensou em Marcus e em como seu coração se partira com o término repentino – Ele estaria pronto para flertar novamente? Seu coração respondia “não”. Seu corpo, subitamente enrijecido e arrepiado, respondia sim. Desligando a panela, desceu pelo elevador. Foi até a portaria verificar se havia correspondência e voltou bem a tempo de subir com a nova vizinha. Apresentaram-se. Ele com a voz quase sumindo, os olhos baixos e o corpo ligeiramente encolhido pelo frio e pela timidez. Ela com um sorriso cheio de covinhas e os olhos negros muito brilhantes e, ao mesmo tempo, desconfiados. Ele perguntou se ela e a família gostariam de um pouco de sopa de espinafre, para atenuar um pouco o frio. Ela brincou com o fato de que, se aceitasse, estaria fazendo duas coisas que a mãe sempre lhe dissera para não fazer: Conversar com homens estranhos e aceitar comida ou bebida de qualquer pessoa desconhecida. A brincadeira feriu os brios de Berilo – Então, a nova vizinha pensava que ele fosse um estuprador ou um bandido? Tanto pior para ela. Deu um sorriso amarelo quando ela saiu do elevador. Naquela mesma noite, encontraram-se novamente, ele estava na portaria entregando ao porteiro um pequeno pote com sopa, Letícia havia descido para esperar uma pizza que encomendara. Pensou em fazer uma piada sobre o acontecido de mais cedo, apenas para deixá-la constrangida, mas antes que pudesse abrir a boca, bateu os olhos na manchete de um jornal sobre a mesinha da guarita: “ VIOLÊNCIA CONTRA MULHER – O AGRESSOR PODE ESTAR MAIS PERDO DO QUE VOCÊ IMAGINA”. E então, ele se sentiu triste pela atitude que tivera mais cedo: Ela não fizera por mal. Apenas devia estar assustada, morando sozinha pela primeira vez em uma cidade tão grande. Estava se defendendo de um mundo difícil. Ele a observou pegar a pizza e subir. Poderia ter entrado no mesmo elevador, mas sentia que seria constrangedor para ambos. Uma sensação de perda o inundou: Com toda sua timidez e medo do desconhecido, Berilo acreditava que jamais teria coragem de tentar conversar com Letícia novamente – Ele ainda não sabia que quase dois anos depois, uma folha de limoeiro iria dar a eles uma segunda chance de conversar. Outra coisa que ele não sabia é que o relacionamento deles seria tudo, menos um clichê ou conto de fadas.

Sopa de espinafre

3 colheres de sopa de azeite

1 cebola média picada

1 maço de espinafre em folhas

2 batatas grandes

2 dentes de alho picados

Sal, noz moscada, cominho e coentro em pó à gosto.

Ferva água e mergulhe o espinafre por um minuto. Retire, escorra bem e pique grosseiramente. Cozinhe as batatas enquanto, em outra panela, refogua a cebola, o alho e os temperos. Vá acrescentando ao refogado o espinafre cortado e as batatas já cozidas, escorridas e cortadas ao meio. Desligue o fogo e coloque o conteúdo da panela em um liquidificador, bata bem, acrescentando aos poucos 700ml de água. Volte para a panela, acerte os temperos, cozinhe até engrossar e sirva em seguida, colocando um fio de azeite por cima se desejar.

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Antologia poética – Augusto dos Anjos

O primeiro livro concluído do #DesafioLiterário2020 #Julho foi uma obra bastante controversa e uma leitura bastante difícil e cansativa, que me fez sentir vontade de desistir pelo caminho e buscar outra leitura – Coisa que não fiz para não carregar comigo aquela frustração ou sensação de não ter valorizado devidamente um grande autor nacional. E posso dizer uma coisa, com muita sinceridade? Ainda bem que continuei, pois o universo de Augusto dos Anjos não é, na minha visão, esteticamente belo, mas sem dúvida é muito rico, então, quando você começar a ler, não desista, apenas siga em frente, pare quando necessário, mas volte a ler!

Augusto dos Anjos foi um poeta paraibano que viveu entre 1884 e 1914; autor de uma única obra, “Eu” (posteriormente republicada com o título “Eu e outras poesias”, Augusto não foi bem recebido pela crítica de sua época – O poeta tece seus versos com grande morbidez, fixando-se na ideia da morte e da incompletude: É comum encontrarmos em seus versos citações do término abrupto e cruel das vidas não nascidas ou ainda infantes: Fetos, óvulos, bezerros. O poeta aparentemente teve fixação pela angustia acerca de tudo que “poderia ter sido”, foi um poeta dos potenciais inconclusos, cuja obra carrega em seus impecáveis versos, o peso do desanimo e do pessimismo. Augusto morreu jovem, aos trinta anos de idade, porém deixou como legado uma obra madura onde tece críticas à sociedade sem perder de vista o rigor formal dos versos e a riqueza de vocabulário onde utilizou copiosamente metáforas, termos científicos e filosóficos. A leitura é por si só bastante complexa e não se esgota com o término da obra, exigindo que o leitor se dedique também a leituras de apoio, como estudos e artigos. Por outro lado, talvez ao leitor que busque apenas um conhecimento básico sobre a obra, numa leitura pelo puro e simples prazer de ler, bastaria adquirir uma versão do livro com um excelente prefácio e boas notas de rodapé – Como é, por exemplo, a Antologia Poética organizada por Ivan Cavalcanti Proença para a coleção Biblioteca Folha, volume cuja leitura eu iniciei no primeiro dia deste mês e concluí hoje, dia dezoito. Confesso que, para mim, apenas a leitura dos excelentes estudos e dos poemas, não bastou, motivo pelo qual, como em outras ocasiões, deixarei as indicações de monografias e artigos que estou lendo aos poucos para mergulhar um pouco mais aprofundadamente no universo do autor.

Bibliografia indicada

DOS ANJOS. Augusto. Antologia Poética de Augusto dos Anjos/Augusto dos Anjos estudos e notas de Ivan Cavalcanti Proença – Rio de Janeiro Ediouro; São Paulo: Publifolha, 1997. – (Biblioteca Folha;24)

FERREIRA. Renan Mendonça. Conteúdos temáticos e ideológicos em Augusto dos Anjos.  Disponível em http://dspace3.ufes.br/bitstream/10/3240/1/tese_4543_.pdf

FONSECA; Deize Mara Ferreira. Sentir com a imaginação: Edgar Allan Poe, Augusto dos Anjos e um gótico moderno. Artigo publicado na revista Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 44, n. 2, p. 40-48, abr./jun. 2009, disponível no site revistaseletronicas.pucrs.br

SABINO. Márcia Peters. Augusto dos Anjos e a poesia científica. Disponível em http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/LinguaPortuguesa/marciapeterssabino.pdf

Dom Casmurro – Machado de Assis

Afinal, Capitu traiu ou não traiu Bentinho? Essa, sem dúvidas, é uma questão que ficará eternamente marcada na memória de quem se aventura pelas páginas de Dom Casmurro. E talvez, seja exatamente essa a genialidade da obra: Provocar a curiosidade do leitor, a ponto de fazê-lo reler trechos inteiros, examinar o caráter das personagens através dos capítulos tentando buscar na Capitu criança os traços de malícia que a fariam infiel e no Bentinho menino os traços da inocência que o cegariam para a verdadeira face da amada.

      Li Dom Casmurro pela primeira vez com dez ou onze anos de idade. Nessa idade, foquei na história – O menino que descobre amar a menina da casa ao lado, sua companheira de infância e brincadeiras e depois de casado, descobre a traição ao notar as semelhanças do filho com o melhor amigo. Sim, aos dez ou onze anos, na minha cabeça, a traição de Capitu era uma certeza, bem como o sentimento de revolta que martelava: Como uma mulher é capaz de trair o homem que tanto se esforçou para mudar os planos que a mãe havia traçado para ele? Como? Depois fiz nova leitura, na época do vestibular. Era mais adulta, me atentei em detalhes como o ciúme de Bentinho, que o torna uma personagem complicada desde a entrada no seminário, e concluí que não, Capitu não traiu Bentinho – Ele é que, dominado pela insegurança e pelo ciúme, construiu uma narrativa tortuosa ao relembrar pequenos fatos do dia a dia. E então, eis que, aos trinta e três anos, na terceira releitura, percebo a construção das personagens tão minuciosa que a dúvida sempre subsistirá: Capitu, em menina, era manipuladora: Traçava planos, observava as pessoas buscando entender como poderiam ser úteis, dissimulava quando era pega em situações que poderiam comprometer seus planos. Sabia fazer-se querida, necessária, amada. Bentinho, por outro lado era mais inseguro, ciumento e manipulável e, provavelmente, acabaria seguindo o destino traçado por sua mãe, tornando-se padre, caso Capitu, muitas vezes, não se empenhasse em orientá-lo. Bentinho é inocente na infância, possivelmente devido a sua criação direcionada ao sacerdócio: Notemos que ele não tem amigos e sua única companhia é Capitu e, em certo período, o rapaz doente com o qual troca correspondência acerca de um conflito internacional. A inocência da infância dá lugar à insegurança do adolescente e ao ciúme, que lhe acompanhará: Bentinho olha Capitu com adoração, acreditando e ao mesmo tempo, desconfiando dela. Essa construção das personagens é muito interessante – Faz-se preciso lembrar que, Dom Casmurro é um livro escrito já sob a luz da escola realista e Machado de Assis debruça-se com empenho na criação psicológica de suas personagens, quase não há descrições longas da natureza e do ambiente, e mesmo as descrições físicas são breves e diretas, portanto é preciso se atentar ao contexto e ações das personagens para perceber o envolvimento entre elas.

      Após essa terceira leitura, fui pesquisar e encontrei alguns trabalhos acadêmicos sobre a obra, dentre eles este que tem como foco a personagem Capitu, apesar de alguns erros de digitação, achei uma analise bem interessante que merece ser lida. Já havia também indicado um livro sobre a filosofia na obra de Machado de Assis neste outro post. E pretendo ainda ler outras obras para aprofundamento no universo deste grande escritor (Inclusive, se leram algo neste sentido, indiquem nos comentários).

Dom Casmurro foi uma das obras sorteadas para a leitura no #DesafioLiterário2020 #Maio (Quer saber quais foram as outras? Clique aqui. Quer acompanhar as resenhas dos outros dois livros? Histórias Fantásticas e Cyrano de Bergerac? Clique Aqui e Aqui) e infelizmente eu terminei a releitura com um dia de atraso e só hoje terminei de escrever sobre ele, por isso estou postando já no quarto dia de Junho, quando a lista do #DesafioLiterário2020 #Junho já está publicada aqui.

Enfim, qual a sua opinião: Capitu foi ou não foi infiel? Conta pra mim nos comentários!

Dica Literária: Bagagem – Adélia Prado

O segundo livro do #DesafioLiterário2020 #Fevereiro é a obra “Bagagem”, da poetisa mineira Adélia Prado. Nascida em Divinópolis no dia 13 de Dezembro de 1935, Adélia Luiza Prado de Freitas é poetisa, contista, filósofa e professora.

Em 1976, no livro “Bagagem”, o primeiro de sua carreira literária, Adélia escreve poesias sobre o cotidiano: amor, família, morte – literalmente a bagagem que uma alma carrega pelos caminhos tortuosos da vida. Autora da escola Modernista, Adélia não se prende a questão métrica em sua poesia. Seus textos trazem uma sensação de observação perplexa, permeada pela fé (cristianismo), com ritmo lento e uma falsa ideia de leveza  que se desfaz conforme a leitura avança e demonstra claramente que versos simples, sem vocabulário rebuscado e excessivo zelo com métrica também são capazes de compartilhar angústias, amores, lembranças…

Quer saber mais sobre o Desafio Literário? Clique Aqui! Quer conhecer os livros propostos para o mês de Fevereiro? Só clicar aqui!

Dica Literária: Clara dos Anjos

Quando gravei o vídeo propondo o #desafioliterário2020, escolhi, dentre os cinco livros sorteados a obra Clara dos Anjos como meta de leitura para Janeiro. Quem quiser ver um resumo das outras quatro obras propostas no desafio é só clicar em cima dos títulos:

Office boy em apuros, Sobre a modernidade, Memorial de Aires eUm tempo para você.

          Lima Barreto escreveu sobre a vida na periferia, nos apresentando personagens que podem ser presentes em qualquer cidade – O poeta frustrado, o pai de família dedicado, a viúva recatada, os malandros, o dono de botequim, o funcionário público, entre outros. Numa época em que a virgindade feminina era um tabu e perdê-la trazia conseqüências irremediáveis, Lima Barreto nos conta a história de Cassi, um jovem cuja única ocupação é promover rinhas de galo, um tanto bronco e de caráter estragado pelos excessivos mimos e proteções de sua mãe – mulher que tem ares de arrogância e pretensões de nobreza – e de Clara dos Anjos, moça negra (o autor utiliza o “mulata”, termo esse que hoje sabemos racista e que deve ser evitado), muito jovem e filha de Joaquim dos Anjos e de Engrácia, mãe que se dedicou a protegê-la do mundo e dos riscos que as moças correm. O autor, no desenrolar da história, se dedica um bom tempo a cada uma das personagens, relatando fatos de sua vida e fazendo observações sobre como estes fatos influenciaram seu caráter e seus vícios e, no caso de Clara, fica evidenciada a crítica ao modelo de educação onde a realidade é ocultada numa tentativa falha de “proteger” as meninas. Em outros pontos, o autor critica claramente o governo, seus impostos e o não retorno deles na forma de melhorias na qualidade de vida da população – o que torna o livro bastante atual, tendo em vista que pouca coisa mudou de lá pra cá no tocante a esse “retorno”.

            Como já é de se imaginar, Cassi conhece Clara dos Anjos ao ser convidado para tocar “modinhas” no aniversário da jovem – os dois pouco chegam a conversar, pois como a má fama do violeiro o precede, a família trata de manter a moça afastada, sem, no entanto, explicar os motivos de tantos cuidados. Todo esse mistério atiça a curiosidade de Clara que, tendo crescido em um ambiente isolado e com a imaginação desenvolvida pelas modinhas de amor, acredita ter encontrado em Cassi um homem para amar. Cassi, por sua vez, olha para Clara com o mesmo olhar que teve para tantas outras moças de sua condição (pobres e descendentes de negros, colocadas, portanto à margem da sociedade) – Deseja conquistá-la e se divertir, para depois abandoná-la. Para isso, planeja passo a passo uma forma de se aproximar, utilizando-se de fraquezas morais de amigos da família e da inexperiência da jovem. Quando ela se dá conta, o mal já está feito: Clara se vê grávida e desamparada, percebendo então que “nada vale neste mundo”.

            Embora para alguns leitores o linguajar do autor possa parecer racista e conservador, é preciso lembrar que em 1922, ano em que foi escrito, o livro foi uma dura crítica ao modelo de sociedade e ao preconceito racial que ele mesmo sofreu– Lima Barreto, homem negro e oriundo de família pobre, soube com maestria utilizar a literatura para empreender críticas e retratar o seu povo: Não o povo carioca em amplo sentido, mas o povo dos subúrbios. Clara dos Anjos foi o último livro escrito no ano de sua morte e publicado somente em 1948. É assustador perceber que a história foi escrita há 98 anos e permanece atual! Se observarmos nosso entorno, perceberemos que apesar das grandes mudanças de comportamento ocorridas nestes quase cem anos, ainda há muitos motivos de descontentamento e revolta com questões sociais, com os políticos eleitos, com o preconceito e com os julgamentos baseados puramente na vida íntima das pessoas.

            Foi uma excelente releitura e, percebo que com o passar dos anos, temos novas impressões sobre o livro, entendendo um pouco mais sobre o contexto social da época e o minucioso trabalho de criação empreendido pelo artista – Nuances que são praticamente ignoradas quando lemos em tenra idade e que são explicadas em longas aulas de literatura durante os últimos anos do Ensino Fundamental ou os primeiros anos do Ensino Médio, mas que aparentemente só são “sentidas” com uma leitura mais adulta. Na dúvida, se você ainda é jovem, leia e se puder, depois de adulto, leia novamente.

            Como no meu post anterior eu coloquei um link sobre a obra e algumas pessoas comentaram e gostaram, procurarei colocar, sempre que possível,  artigos acerca do livro em comento. Sobre “Clara dos Anjos” encontrei dois bem interessantes, o primeiro elaborado por Tauã Lima Verdan Rangel, Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Tauã traz uma interessante análise sobre o livro, a sociedade da época e os ordenamentos jurídicos então vigentes (leia aqui). O segundo texto trata da estigmatização de Clara dos Anjos e foi publicado por Marcos Hidemi de Lima no portal Literafro – O portal da literatura Afro-Brasileira da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (leia aqui). Para quem deseja se aprofundar é muito interessante.

Dicas literárias: Vale tudo? (Agnaldo Silva, Gilberto Braga e Leonor Basseres)

Confesso que não sou uma grande fã de novelas, minha mãe, atualmente, também prefere outras distrações. Entretanto, ela vez ou outra fala sobre filmes ou novelas de alguns anos atrás, dentre elas, a novela “Vale Tudo?” e seu mistério “Quem matou Odete Roitman” e talvez esse tenha sido o motivo pelo qual decidi ler este pequeno livro. Me surpreendi! Muito bom! Tão bom que terminei de ler  sentada no chão do VLT lotado após um dia de trabalho.
Sobre a história: A trama gira em torno de Odete Roitman, uma senhora extremamente rica e manipuladora e da natural atração que o dinheiro e status de sua família exercem sobre pessoas inescrupulosas. Em “Vale Tudo?” a vida é um audacioso jogo – Seja pelo dinheiro, seja para escapar das armadilhas criadas por gente ambiciosa e disposta a mentir, manipular e trair em troca de poder e dinheiro. Uma leitura rápida (95 páginas) e muito boa!
Aliás, bem que as novelas poderiam ser todas publicadas como livros!

Dica literária: O príncipe fantasma(Ganymédes José e Tereza Noronha)

Uma família vai passar os dias na fazenda que pretende comprar – a casa é linda e o espaço enorme, entretanto, como na vida nem tudo pode ser perfeito, histórias estranhas rondam o lugar. O clima de mistério e suspense aumenta na medida em que chegam visitantes curiosos ao mesmo tempo em que fatos estranhos e assustadores começam a acontecer. Será que há mesmo um (ou dois) fantasmas rondando a fazenda Santa Odília? Só lendo para descobrir! Vale muito a pena embarcar nesta aventura fantástica!

O Príncipe Fantasma é um livro curto, divertido, cheio de suspense e mistério, ideal para incentivar nos pré-adolescentes o gosto pela leitura. Os autores conseguiram criar uma história que dosa na medida certa elementos como convivência familiar, suspense, romance e humor, utilizando um vocabulário rico porém não muito rebuscado favorecendo uma descoberta saudável e natural das belezas da língua portuguesa.

Exemplar em bom estado de conservação disponível para venda (valor simbólico R$15,00) ou troca – Somente para quem mora na Baixada Santista ou tem condições de vir até aqui buscar.

 

Noites na Taverna (Álvares de Azevedo)

Setenta e três páginas,algumas histórias intensas e um final surpreendente. Alvares de Azevedo trás em seu livro “Noites na Taverna” toda a tensão das histórias que se pode contar em uma noite entre amigos. Em comum nota-se o envolvimento das personagens com mulheres idealizadas, em histórias de amor impossíveis e trágicas.

Infelizmente o poeta morreu jovem, aos vinte anos de idade, senão teria deixado um legado ainda maior. Um dos principais expoentes do ultra-romantismo (ou 2º geração do romantismo/Mal do século) no Brasil, Álvares deixou uma obra pequena e inigualável, publicada postumamente

Para quem gosta de leitura on line: Noites na Taverna 

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Til (José de Alencar)

Há tempos eu não lia um romance que realmente prendesse a atenção – Pelos comentários que tracei acerca das minhas últimas leituras é possível perceber que estive em uma péssima maré de sorte literária e, finalmente, essa maré ruim deu uma trégua já nas primeiras páginas de Til, obra escolhida para o mês de Março.

Til é uma narrativa da maturidade de José de Alencar (Mecejana/Ceará, 1929 – Rio de Janeiro/RJ, 1877). Seu estilo é bastante regionalista, descrevendo usos e costumes da época e do local onde a história se passa, ou seja, do interior do Estado de São Paulo. Calma! Nem toda a obra de cunho regionalista/nacionalista é difícil ou cansativa de ler e, no caso do livro em comento é importante salientar que a leitura flui facilmente, uma vez que o autor consegue narrar em poucas páginas uma trama complexa, intensa e muito envolvente. Berta, ou Til, personagem principal da narrativa, é uma menina de alma extremamente bondosa e a trama descortina aos poucos como sua vida se cruza com pessoas que fizeram parte de sua mais tenra infância e  a forma como sua presença altera o rumo das pessoas a seu redor.

Sou suspeita para falar sobre clássicos da literatura nacional pois raramente minha opinião apresentará pontos negativos – pelo contrário, em geral só encontro elogios aos nossos clássicos, especialmente tratando-se de obras de autores como José de Alencar ou Machado de Assis e, a leitura de Til só veio reforçar essa paixão literária e deixou um adorável gostinho de “quero mais”. E você, leitor(a), já leu “Til”, o que achou? Se já leu, deixe um pequeno comentário sobre o livro e, se não leu, não perca tempo! Leia!