O Domingo vai chegando ao fim. Que semana! Na cozinha, penso nos últimos acontecimentos – O caos mundial, por alguns momentos, toma o lugar da poesia, dos contos da menina, dos amores da mulher. Enquanto corto a berinjela, questiono, de mim para mim – O mundo não deveria ser um lugar belo, gentil, doce? E então, uma frase da Lou A. Salomé é sussurrada pela minha memória: “O mundo não lhe será gentil, creia-me. Se quiser ter uma vida, roube-a”. E assim, numa realidade onde as pessoas pertencentes às classes dominantes acordam e, antes mesmo de beber o primeiro gole de café, pensam “O que farei hoje para piorar a vida dos trabalhadores e destruir o meio ambiente?”, percebo que a grande maioria de nós tem feito muito pouco para “roubar” uma vida digna de ser vivida – E o sistema, embora não seja um ser vivo, vem roubando a nossa vida. E assim, vimos o Brasil aumentar descontroladamente o número de mortos pelo vírus, vimos o fechamento das bases do Projeto Tamar, vimos pessoas insanas imitando a Ku Klux Klan em apoio a um louco que ascendeu ao poder nas últimas eleições e, dia após dia, nos leva a um abismo. Nos Estados Unidos, um policial quebrou o pescoço de George Floyd, um homem negro já rendido no chão e o presidente de lá incita a polícia a atirar em manifestantes (O que esperar de quem separa mães e filhos na fronteira, além de barbárie). E não, não é o momento de tomar as ruas, existe um inimigo invisível capaz de dizimar populações inteiras, mas, por outro lado, “se queres ter uma vida, roube-a”, e é isso que essas pessoas que corajosamente estão nas ruas fazem: Tentam roubar de volta o direito a uma vida que o sistema capitalista nos tomou, e eles o fazem por eles e por nós. Meus olhos brilham ao ver a reação do povo norte americano e imagino que, se a cada jovem assassinado pela polícia brasileira, houvesse uma reação idêntica a que ocorre por lá, já não teríamos mais pedra sobre pedra ou já não teríamos mais tantos e tão freqüentes barbáries. Por lá, eles estão lutando e essa luta já se espalhou pela Alemanha. Quando chegará aqui? Outro caso interessante, pensado entre alho, cebola e uvas passas que irão para a panela: Hoje, brasileiros que desejam uma ditadura, foram às ruas e encontraram, nas mesmas ruas, brasileiros que lutam pela democracia – Quem apanhou? Os segundos, infelizmente. Fica aqui, neste texto, minha homenagem a eles e elas, que enfrentaram fascistas, polícia e vírus em nome do bem comum. Se não fosse o vírus, eu estaria nas ruas também, mas essa já é outra história. Por fim, enquanto coloco sobre a massa de pizza esse recheio de berinjela com passas, pedaços de pimentão e de tofu (quem quiser saber a receita da pizza, vá para o outro post, lá tem e o texto é menos indigesto), torço para que esse desgoverno não acabe em uma gigantesca pizza e ao mesmo tempo, lembro que preciso pesquisar sobre a relação entre beber leite e rituais de supremacia branca – Uma das últimas peripécias governamentais foi uma “live” bebendo leite e muitas pessoas dizem que há todo um escroto simbolismo no ato – Na dúvida, meus amigos, vos digo: Ainda bem que nunca fiz amigos bebendo leite!
