Observo os quiabos sobre a pia – É inevitável o sorriso quase sarcástico que acompanha meus pensamentos – De todas as coisas que imaginei fazer neste ano de 2020, e foram muitas, desde os planos mais básicos até as loucuras mais improváveis, ficar presa em casa, saindo raramente, sempre de forma planejada, em uma quase operação de guerra que busca evitar as áreas e os horários mais movimentados, usando uma máscara e sem poder sequer estender a mão para cumprimentar qualquer conhecido que, apesar de meus extremos cuidados, cruze meu caminho, é algo que definitivamente não constava sequer das minhas hipóteses mais loucas. E acreditem: Minha imaginação é bem grande. Digo tudo isso, pois, olhando pros quiabos me lembro da última ida ao mercado: Ao chegar, apesar da tensão, não houve como fugir do riso: Quem imaginaria que estaria dando banho em garrafa de óleo e limpando sacos de arroz e farinha com álcool gel? E quem poderia supor que, ir à feira, nestes tempos significaria comprar coisas para duas semanas e chegar a casa com paciência para higienizar tudo metodicamente antes de guardar? Como não rir de bananas e abacaxis sendo lavados? Pois é, tempos estranhos. E tempos estranhos fatalmente trazem uma necessidade de inovar, improvisar. Um exemplo é o meu gosto pelo alho – Geralmente coloco 5, 6 dentes na maioria dos pratos – Seja no feijão, no molho de tomates, no quiabo. Mas, sem poder sair cada vez que algo acaba, fiquei encarando aqueles quiabos que imploravam por muito alho, enquanto, em um pote, o feijão fradinho cozido também implorava por alho e ainda ia adiante, exigindo que eu deixasse de lado o quiabo e o transformasse logo em um feijão tropeiro – prato que em outros tempos muito me agradava. Mas como inventar versões veganas em meio ao caos? Acredite, neste momento o quiabo assobiou baixinho e disse: Usa-me nesse feijão tropeiro aí! E então veio a ideia: Piquei meus cinco dentes de alho, higienizei os quiabos. Piquei o alho e coloquei numa panela de fundo grosso, coloquei sal e óleo e fui picando os quiabos em rodelas fininhas naquela panela quente, para que fritassem. Terminados os quiabos, acrescentei meia cebola e um pedaço de pimenta vermelha e, por fim, o feijão com o mínimo de caldo possível – Tudo fritando junto e misturado. E então, o toque final: Acrescentei farofa na mistura, mexi delicadamente até secar de vez e estava pronto meu feijão tropeiro vegan. E, olha, ficou muito bom – Num futuro, quando não for mais necessário ficar em casa ou dar banho nas embalagens, possivelmente eu varie os vegetais, ou apenas aumente mais a quantidade de alho!