Falar sobre a vida e a história de alguém é sempre uma grande responsabilidade – o biógrafo pode muito bem conhecer datas e fatos, mas terá um longo caminho para chegar a conhecer as motivações que levam alguém a traçar seus rumos. Escrever sobre uma mulher como Patrícia Galvão é uma tarefa ainda mais complicada – Pagu foi intensa, buscou incessantemente um motivo ao qual devotar sua vida e encontrou na militância comunista a causa pela qual lutaria.
Paixão Pagu é a autobiografia escrita por Patrícia durante o período em que esteve encarcerada – O livro, publicado anos após o falecimento de Patrícia, é na realidade uma longa carta escrita para o companheiro, narrando sua história desde os tenros anos da juventude. Retomando o parágrafo anterior – Falar sobre a vida de alguém é uma responsabilidade e um desafio enormes – ainda bem que Patrícia encarregou-se de contar a própria história – a complexidade de uma pessoa como ela e também do tempo em que viveu é certamente melhor destrinchada desta forma: A história escrita por quem a sentiu na pele.
É fato que lutar por uma sociedade justa e igualitária é escolher um caminho árduo. Fazer isso nos tempos em que ser comunista levava pessoas à prisão e tortura é heroico. Fazer isso nos citados tempos e sendo mulher era se jogar em meio ao fogo duplo: Perseguida pelo sistema vigente e testada o tempo todo pelos próprios companheiros do Partido Comunista, Patrícia lutou para provar seu valor – por anos abdicou da maternidade e da alegria de ver o filho crescer, dedicando-se unicamente às tarefas da militância, sem nunca encontrar total aceitação dentro do partido, por ser mulher e por ter berço pequeno burguês. Isso traça um recorte historicamente bem interessante – A luta contra o machismo, muito presente em vários setores da esquerda brasileira – não era uma pauta sequer cogitada na época de Patrícia. Tal observação histórica, bem como a própria história, faz da obra uma leitura obrigatória. O livro é curto, porém visceral e merece uma leitura atenta e crítica no sentido de refletir sobre o passado e comparar com o momento político presente para evitar que os erros de ontem se repitam e mais sangue inocente venha a ser derramado por conta de uma construção social desigual e autoritária.
Opinião:
Conhecer a história da Pagu foi o que posso chamar de “um choque de realidade” – como mulher e principalmente como militante de esquerda, confesso que até o momento não consegui entender de onde ela tirou tanta força. Em alguns instantes cheguei a pensar em abandonar completamente a militância por entender que jamais seria forte como ela foi. A carta de Patrícia emociona, machuca, desestabiliza – Mas depois de muita reflexão e inúmeras tentativas de traçar uma pequena resenha, o desconforto inicial quase insuportável dá lugar a outros pensamentos: Se desde o início da luta pela construção de uma sociedade socialista, contássemos com pessoas como Pagu, estaríamos já vivendo outra realidade. Se por outro lado cada lutadora que se reconhece como “não tão forte” tivesse desistido, estaríamos mergulhados em um caos ainda maior que o atual e muitas guerreiras valorosas teriam tombado sem sequer se darem a chance de descobrir toda a força que tem por não terem se dado essa chance. Eu decidi continuar trilhando o caminho que iniciei há anos atrás – até onde, o destino vai dizer – mas espero poder ver meus futuros filhos crescerem em uma sociedade muito mais justa que a atual.

Título: Paixão Pagu – A autobiografia precoce de Patrícia Galvão
Autora: Patrícia Galvão
País: Brasil
Editora Agir