Um conto de páginas em branco, sonhos e raios de Sol

Naquela Segunda-Feira o dia começara diferente – O Sol, que sempre a encontrava com feições de sono, a encontrou em pé, pensativa, observando os primeiros raios de luz que se esgueiravam pela porta entreaberta da cozinha. Tivera um sonho bom na noite anterior – Um sonho tranqüilo, onde ela e ele caminhavam de mãos dadas e pés descalços em uma areia clara. Acordou com uma sensação boa, uma vontade de sorrir e de vê-lo novamente, sabia, entretanto, que com sorte conversariam um pouco por mensagens e nada mais – Afinal, a vida insiste em adicionar mais afazeres do que horas livres na vida das pessoas. Pegou o caderno para guardar na bolsa – Há dias não conseguia escrever  nada que não fosse sobre aquela noite ou o que sentira depois disso – Prometeu a si mesma escrever sobre outra coisa naquele dia, mas, antes de guardar o caderno, abriu a última página em branco e começou a escrever – traçou linhas e outras tantas linhas sobre o quanto foi real a sensação de caminhar com ele durante aquele breve sonho interrompido cedo demais pelo despertador, sobre como suas mãos pareciam encaixar-se perfeitamente e seus passos se alinhavam na areia, como se caminhassem numa coreografia. Ela escreveu sobre o sorriso dele, sobre os olhos que eram ao mesmo tempo lago e floresta e a faziam sentir-se menina-sereia-fada. Ela escreveu sobre o sol ameno e o mar azul, sobre a areia branca que foi em seu sonho o tapete de um caminho feliz. E escreveu sobre acordar desejando continuar o sonho. Naquele amanhecer, ela acordou com vontade de voltar aos sonhos e de poder voltar no tempo. E então, olhando aquelas páginas, pela primeira vez, perguntou-se quando havia passado a vê-lo como alguém que lhe despertava desejos que iam além da amizade compartilhada – desde quando mãos entrelaçadas e abraços haviam deixado de ser meras alegrias e carinhos com sabor de infantil ternura? Quando se dera conta do quão atraente ele era e passara a desejar mais que meramente amizade? Eram tantas perguntas sem respostas que iam se acumulando – E que adiantava afinal tentar respondê-las? Qual a importância de delimitar sentimentos por datas exatas? Marcara a data do primeiro beijo- que talvez fosse o último – ou o primeiro, e concluíra que não era importante saber desde quando o olhava com olhos de moça encantada. A vida seguiria, assim como seguiam os minutos passando, a água do café fervendo, o Sol subindo mais e mais em direção ao centro do céu. A vida seguiria e se encarregaria de tornar aquele sonho real ou não. A vida seguiria e ela seguiria junto, escrevendo seus diários como fossem contos, como se pudesse observar do alto e de longe, numa vã tentativa de se proteger daquele turbilhão de sentimentos ao colocar-se como observadora. A vida seguiria e ela haveria de aprender novamente a se proteger, quando na verdade, o que mais queria era ser protegida dentro daquele abraço que a apartara do mundo por alguns instantes e a fizera voar ao céu…

 

09-10-17

 

Publicidade